domingo, 25 de dezembro de 2011

Síndrome do não pertencimento


       Há algum tempo, encontrei-a de bruços sobre o choro derramado. Quando os soluços a deixaram esboçar um murmúrio, caiu em novo pranto... O pranto do seu não pertencimento.
       A vaidade de sua coleção de amores não fora capaz de contê-la e ei-la fluida na espiral de seus afetos. Seu amor era tão maior que não caberia em alguém, em ninguém. E nem por isso era melhor que coisa alguma. Nem o mundo a continha, então o tal estranhamento. Por mais que se apressasse, o tempo lhe corria nas veias, no sorriso do filho que não tinha e a morte instruía seu tanto de vida. Tinha amigos, amores e muitos anos. Uma semana depois adotou um gato.
      E quando mais recentemente a encontrei, com um riso leve e bobo pendente dos lábios, disse-me que agora estava presa num grande par de olhos amarelos e depois me contaria o que era estar contida em. Depois, certamente com propriedade, discorreria então sobre seu pertencimento.


Uma música de gato só pra chatear o silêncio: http://www.youtube.com/watch?v=S2Lke5o5ORg&feature=g-upl&context=G23f40d6AUAAAAAAAGAA

Fala de Natal


Hoje eu sou uma palavra vazia de tudo dentro. Uma palavra ao avesso.  O verso das avenidas mudas e o verbo nu de quem desfala coisas.  Algo como a palavra sem epiderme, derme, nem gérmen ou silêncio. Só a boca cheia do nada num riso ladino de esquecimento. Mas daqui a pouco a madrugada vomita o dia e pronto! Religa-se o botão das alegorias.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

‘Pequena consideração sobre a fugacidade da embriaguez’ ou ‘Breve conto para Hans Christian Andersen’, ‘Rápida melodia para Caymmi’ ou talvez ‘Um causo de peixe para pescador ‘


“De repente as ondas salgadas conheçam o toque das pedras do mar”. Era mais ou menos isso que dizia a letra da canção. Era uma canção praieira tão docemente cantada que poderia enfeitiçar qualquer marujo ou escolado pescador. Mas a sobriedade veio a reboque do último gole de café. 

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Muita gente pra pouca humanidade


  N´alguma fenda secreta de nossas almas, um serzinho ínfimo, quase invisível, alimenta dia após dia, um Hyde carniceiro, um Exu faminto, um diabinho com tridente afiado. E cada um sabe a hora de soltar os bichos. Cada um sabe quando toca o terceiro sinal para lançar seu monstro ao público.E é nesse átimo bestial que nos batizamos de tão propagada humanidade. Paradoxalmente, é neste mesmo instante que ressoam dos quatro cantos burburinhos como “Isso é desumano!!”. Essa humanidade hígida é uma perfídia, daí a máxima cristã: “... que atire a primeira pedra...”
      Hyde está sempre se aquecendo atrás da cochia...Qualquer hora ele ganha a cena e não vai ser uma pedra que ele vai lançar. Ele vai chegar montado numa catapulta! E depois do espetáculo, sem nenhuma polidez, arrotará na cara dos pagantes, sem ao menos lembrar de agradecer ao serzinho ínfimo que tão desveladamente o alimentou. Talvez Hayde cante algo assim...

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Sem Lua


Passou pra lá de um ano morta de amores pelo rapaz forte que tinha um dragão tatuado no tórax e sorriso de garoto Colgate. Nunca foi dada aos bonitinhos, mas eis que...

Só que do seu violão mal tocado não saíra uma só musiquinha desse amor doído. Doído sim porque ela não era o tipo de moça que servisse para o tal rapaz bem apessoado. Era feia, sem graça, usava óculos totalmente démodé e calças folgadas e amarrotadas. Mas era devota de São Jorge, gostava de lua, filha de Oxóssi... E ele tinha um dragão.

Todos os seus outros amores, solitários ou não, tiveram melodias. Mesmo os breves affairs! Como este não tinha nem um refrãozinho, resolveu achar que era castigo. Afinal, amores baratos não valiam canções!
E com a graça passada do tempo que a todos e tudo cura, ei-la eufórica com novos ares, agora mais condizentes ao seu “tipo de rapazes eleitos”. O moço não era alto nem baixo, não era gordo nem magro, nem careca , nem cabeludo, nem muito jovem nem tampouco velho demais,  mais carismático que propriamente inteligente e usava óculos também démodé!

E então seria noite de lua... E ela uivando pelas algibeiras! Mandou ao novo rapaz alguns torpedos empolgados sobre um tal lual, sobre o primeiro dia de lua cheia...  Ele, mesmo sem o charme, nem o dragão do garoto Colgate, fez-se de desentendido.

Ela abriu a janela, afinal, ao menos teria a lua... Que não apareceu!  Então, restou o violão e um poeminha musicado que ela gravou mesmo sem o status de sofrível!

No dia seguinte, uma angustiante ressaca melódica! A maldita musiquinha mal tocada falava de dragão, de Jorge... E o novo rapaz nem lhe devolvera o torpedo! Ficou sem lua, sem  graça ... E ainda perdeu a música para o velho amor barato!

 ............. A FadaBêbada, sem dó nem piedade publica o link da música pouco sofrível abaixo. Pobre moça desaluada.....
http://www.youtube.com/watch?v=KknwEBzRCeY&feature=g-upl&context=G1ab99AUAAAAAAAAAA

domingo, 11 de dezembro de 2011

A menina que falava demais



Ela usava sapatos coloridos. E trocava alhos por bugalhos. Tinha discalculia – comumente lia 78, que era o número da sua casa, mas falava ou escrevia 87... Por isso certamente elegera, mesmo que inconscientemente, o 33 como seu número da sorte.  Trinta e três era trinta e três e pronto. Sempre seria.

Talvez também tivesse dispraxia. Batia-se com frequência nas coisas, pisava mal, caía. Era, no senso comum, estabanada, como diziam sempre. E tinha uma descoordenação motora inimaginável.

E falava demais para tentar esconder o silêncio da sua timidez. Entristecia quando não ouvia o eco de um pensamento. Então ela pensava, pensava... Pensava até a mente fazer calo e só era feliz cantando porque achava que a música era o pensamento com roupa de festa.

Assim ela vivia a falar... E a cantar... E a sorrir. Falava para esconder o silêncio, cantava, que era a fala mais aprumada e sorria porque sorrir era a felicidade da canção!

E quem a conhecia, não poucas vezes se deixava encantar pelo riso, ou pela música, pela fala... Mas vinham os dias, e as noites, e os dias de novo... Até que chegava a falácia e descobria o encanto. Afinal, ela tropeçava nos próprios pés... Perdia a data do pagamento das contas, perdia as contas! E esquecia! Esquecia a porta aberta quando era pra fechar ou fechada quando era para abrir.

Era deste jeito que quem se apaixonava por ela, não tardava a se desapaixonar.  E voltava o silêncio, em seu cortejo mudo e certeiro, envolvendo-a num manto aprumado, comprido ... Ela emudecia, ficava séria, punha os óculos de grau e trocava os sapatos coloridos por pantufas desbotadas. Quando já quase se esquecia de si em seu próprio esquecimento, chegava-lhe, de repente, algum tilintar de vento na janela, algum tamborilar de chuva na calçada e ela recomeçava a contar e a cantar a musiquinha das coisas...

Até que um dia, alguém, que não se apaixonou pelo canto, nem pelo conto da menina que não contava direito, deixou-se encantar pelo seu silêncio.

Depois deste dia eu não soube dela, já que parou de falar demais e tirou os sapatos coloridos para não fazer barulho por onde andasse.  De vez em quando, aprumo o ouvido e ouço o vento roçar a cortina, porque era isso que ela cantava e dizia que era música e é isso que ela deve estar cantando por aí.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Palavra tentada


Agora não se fala nem pouco mais ou menos sobre o que se pretendia falar.  A palavra que habita os abismos, habita, de quando em vez, as tempestades e faz-se ouvir em pingos –arautos de chuvas.  Fica esquecida na garganta, na boca - cavidade maior do mundo.  Essa palavra, não perdida, mas nunca encontrada é a palavra intentada e resvalada nas (im)possibilidades da língua.

sábado, 26 de novembro de 2011

Ogros de Jardim


       Não era à toa que ela gostava de Ets. ETs verdes, com olhos grandes -  e antenas de preferência! Os brancos não eram exatamente seu tipo. Esperar Ets era mais fácil que esperar sapos conversíveis em príncipes... Até porque ela não gostava de príncipes. Preferia os ogros.
       Ogros não convidam para jantar num primeiro encontro, vão direto ao ponto. Jantar pra que? Para ficar com a boca cheia, medindo palavras de efeito, trocando olhares lascivos... Coisa mais desagradável conhecer o sujeito e se lhe apresentar atrás de um cardápio... Pior ainda se a comida for boa... E tiver de dosar o apetite a fim de não espantar a presa (ou o predador)... E o suprassumo da inconveniência: Não dosar coisíssima alguma e partir para o ataque depois do jantar com refluxos por empanzinamento... Desagradabilíssimo! Então o primeiro requisito para descartar um candidato a príncipe era o funesto convite para jantar.
       Havia um quê na espontaneidade do desleixo que sempre a atraiu... Os olhares perdidos, os cabelos desgrenhados, a barba por fazer, um jeito de mar ou de qualquer coisa que chega e vai embora ou que nunca veio, nem talvez pretenda partir... Era um pouco isso que a encantava... Poder ser a Helena que não voltava, a Penélope que não ia...
       Então beijava latas e chutava sapos... E olhava de vez em quando pro céu esperando algum OVNI que, se não chegasse, mandaria chuva pras azaléias cultivadas pelos ogros do seu jardim!

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

A medida do beijo


Já ia pela conta da quarta estação, desde que ela começara a contar! Aquilo não era mais um beijo... Era uma afronta hipnotizante para a moça do banco de trás que disfarçava o olhar pelo relógio, pousava-o na senhora gorda que imprimia um beliscão bem dado no possível neto irrequieto ao lado, então tornava a esbarrá-lo no casal acintoso à frente... Que, por um instante, parecia desgrudar os lábios...  Mas logo retomava ao estado de ósculo inercial, como se fosse a primeira ou última vez (de repente era mesmo!) ... Carioca, Glória, um solavanco no vagão – que na verdade não a faria balançar mais que o arroubo desmesurado do casalzinho da frente... Largo do Machado, uma espiada se alguma mensagem chegava ao celular, Flamengo... Mas ela era gorda. E ele era feio, tinha marcas de espinha mal cicatrizada na cara. Ela tinha peitos enormes, desproporcionais. Desproporcionais a quê? Decerto que não ao beijo. Botafogo, Cardeal Arco Verde... Então uma pausa. Quando eles se olharam a um palmo de distância ficou patente o quão zarolho ele era. Siqueira Campos, cabeça dela no ombro dele e só o deslizar barulhento do metrô. Novo olhar apaixonado e, antes que a moça de trás perdesse definitivamente sua estação de destino, o casal feio retomava o beijo.
Então, como não houvesse alternativa, senão saltar na última estação, fizeram-na todos: a gorda, o zarolho e a moça de trás. Claro que ela não os seguia, mas até chegarem ao final da estação, não precisaria passar-lhes à frente. Agora não importava mais, não haveria mais beijo para enrubescê-la. O casal feio seguia de mãos dadas e em silêncio sepulcral, não fosse a azáfama do fim de tarde, ao redor.
Quando o casal seguiu pela Sá Ferreira e a moça de trás ficou pra trás mesmo, encheu o peito e vangloriou-se ao final Eu sabia! O beijo não era longo. O papo é que nem era curto!

terça-feira, 15 de novembro de 2011

A antimoral da história

A asa quebrada da Fada deixou-a ainda mais ébria, à base de analgésicos e antibióticos e antiinflamatórios, anticoncepcionais, anti-tudo mais… E ela nem precisa de tanto para seus vôos rasantes… Pois muito bem, recebeu uma visita de um Guru numa tarde dessas, no que poderia ser um sonho ou surto psicótico e foi mais ou menos o que seguiu:
Guru (taciturno) – Você tem descuidado do seu lado espiritual….
FadaBêbada - …
Guru – … Asa quebrada, cama, guarda baixa…. humm…
Fada Bêbada – Outro dia eu sonhei que uma cigana linda, tipo a Carmen de Bizet, dançava e fumava e bebia… E eu lhe oferecia um hibisco vermelho…
Guru (reticente) –E você ofereceu o que ela pediu?
                                                 ….
Então, em confissão pública, veio me falar que, semana que vem, estará comemorando sua borboletice num barzinho próximo, fumando cigarrilha de canela, cigarro de palha e dando pra meio quarteirão porque, afinal, precisa ouvir mais as vozes ocultas da sabedoria.  E que essa coisa de canja e vôo rasante de galinha não tá dando muito pano pra manga não!!!
Um amigo em comum disse cauteloso – Cortem as asas dessa louca! Um outro catou o Google Maps no Iphone e perguntou o endereço do bar.
Moral da história, que não poderia ser outra… Cada um tem as asas, os gurus e os amigos que merece!!

sábado, 5 de novembro de 2011

Sem graça nenhuma

Um dia no Jardim do Paraíso, Eva diz a Deus:
- Senhor, tenho um problema.
-Qual é o problema, Eva?
-Senhor, sei que você me criou, me deu este lindo jardim e estes maravilhosos animais, até esta serpente engracadinha, mas nao me sinto feliz.
- Por que isso, Eva?
- Senhor, estou solitária e já nao aguento mais comer maçãs.
- Bem, Eva, acho que tenho a solução. Posso criar um homem para você.
- O que seria um "homem", Senhor?
- O homem é uma criatura defeituosa, com tendências agressivas, um ego gigantesco e incapaz de compreendê-la ou escutá-la. Ele vai, realmente, dar-lhe muito trabalho. Entretanto, será maior, mais rápido e terá mais músculos que você. Será muito bom para lutar, chutar uma bola e caçar ruminantes indefesos. Você pode usá-lo para seu prazer, para carregar pacotes, abrir a porta, trocar o pneu do carro e pagar suas contas.
- Parece ótimo - diz Eva, arqueando ironicamente a sobrancelha.
- Mas você só pode tê-lo com uma condição...
- Qual é a condição, Senhor?
- Você deve deixá-lo pensar que eu o fiz antes.


Eu não sei contar piadas... Então tentei escrever para a Fada Bêbada uma graça que a fizesse rir. Ela não achou graça. E eu queria muito que ela risse hoje. Mas fechou-me a cara na porta e a porta não abriu mais. Estou procurando a chave. Se alguém achar...

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

A criatura e a palavra


A criatura, cujo hálito embriagado, vomita a noite ida e a bílis amarelada pela janela, fica quieta em seu casulo até a próxima madrugada, quando sai borboleteada e ainda zonza. Ela só não se conforma em ter que dizer alguma coisa. Ela é tão linda em suas asas translúcidas, aeradas, oníricas.... Dizer o que?!
Mas não bastam imagens, nem palavras ocas. Deve haver o óbvio e o óbvio lhe soa pontiagudo demais aos ouvidos. A criatura não cabe na palavra e se recusa a usá-la como recipiente. Também não pretende carregá-la em suas asas. A palavra tem seus próprios artefatos flutuantes...
Comer a palavra e ser comida por ela. É a única imagem que aceitaria gora. Mas essa aceitação é inócua! Então, a criatura torna a fechar e abrir suas asas num silêncio acetinadamente leve. E voltará, depois, ao seu casulo para engendrar os novos dizeres que não dirão nada. Só sua borboletice abrirá e fechará a os lábios e as pálpebras do tempo.

domingo, 30 de outubro de 2011

Pequeníssima consideração sobre ventos e vendavais

Devaneio da fada Bêbada fazendo as vezes de mariposa, vulgo Bichinho de luz, nesses dias de chuva e ventania:
“Porque esse tanto que tenho de vento me vendavaneia e é difícil tocar os pés no chão… Mas, afinal, piratas, marinheiros, astronautas e poetas não se prendem à terra firme…”

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Conselho de bruxa

      Ah, Fada Bêbada... As bruxas é que são interessantes! As bruxas sóbrias, as bruxas óbvias. Ninguém nunca ouviu falar de alguma fada perseguida e queimada nas fogueiras da inquisição. Fadas não são sensuais, são anódinas, insípidas, etérias demais. Bruxas são dolentes, auspiciosas, perniciosas! Fadas jamais queimariam sutiãs. Não têm peito! Fadas têm sexo, bruxas têm buceta.
      E não adianta se esconder na apresentação pedante desde blog: “...Bêbada sim, no sentido da fuga dessas mesmas velhas premissas anacrônicas às demandas atuais”... Balela! Bêbada por falta de equilíbrio emocional ou força de vontade, terapia ou qualquer coisa que falta a ponto de não torná-la bruxa.
      Vá beijar seus joelhos enquanto as bruxas lambem as ruas, as feridas e as crias . Vá criar suas caraminholas. Converse com uma bruxa, peça-lhe receitas de bem viver, de esquecer picuinhas, coisinhas... Pare de gemer fazendo caras e bocas. Gemidos não criam orgasmos como por passe de mágica! Tente gritar de vez em quando, falar alto, deseducar seus bons modos. Deixe de olhar para os sapos cheia de segundas intenções... Homens feios e mal sucedidos costumam trepar melhor que os caras legais com quem você sai pra jantar. E ainda há as lagartixas, as salamandras, os vibradores....
      Ah, Fada Bêbada, hoje é quinta, amanhã é sexta e você aí preocupada porque não fez as unhas! Roa as unhas até o sabugo e veja como seus dedos continuam grandes e longos...
     No mais, se nada do que digo é capaz de tocá-la, toque-se! Ou então, tome uma dose de qualquer coisa que faça seu mundo girar, afinal, você tem que continuar bêbada, ou vão dizer, de repente, que você ficou louca!

domingo, 22 de maio de 2011

Manifesto da Fada Bêbada quanto à última postagem (Primeiro eterno beijo)

Ridículo o teor machista do dito haikai,que também não se prestou ao papel da sedução - se esta era  a finalidade.
Então não  falo nada, só de boca e de beijo:

Beijarei meus joelhos até quando me reste boca e joelhos!! Com eles aprendi a  beijar, virar a língua e roça-la numa imensidão de paixão induzida e predeterminada. Nada de furar laranja e meter a língua dentro, rodando e rodando como um fura-bolos!!A trilha sonora de Piazzolla tocando Villa Lobos me fazia rodopiar dentro do beijo e me faz beijá-los ainda.
Sim, pois os homens de então coaxam nos sapos do brejo e as mulheres nem lábios tem! Não ficarei com minha boca vazia, nem que precise enchê-la de meus joelhos, que tirado o fato de serem convexos têm prestimoso beijo.
Os príncipes, sapos e princesa temem tanto achar uma varinha que os tornem gente, que continuarão encastelados nas suas baladas de sextas-feiras, nos seus ensaios domingueiros, nos seus carnavais de bocas vazias.
Como também não acredito nos contos de amor, continuarei vivendo uma tórrida paixão com meus joelhos, que amam donjuanisticamente, que me roçam a língua como gato de rua roça a perna de quem passa!
Se os protagonistas destes sonhos mal sonhados esconderam a paixão pelas quinas dos castelos vazios, vou me esgueirar pelas paredes e resvalar em tudo quanto seja avassalador até ser execrada ou esquecida e continuar a sós com meus joelhos e as paixões abandonadas dos outros.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

"Lambada de Serpente"



Movimento brusco de serpente
Moça bonita picada
Nem sente dor



Um  haikai para quebrar o gelo!No mais... só whisky (para os que não curtem cowboy, claro!!!)

segunda-feira, 16 de maio de 2011

A moça, a Fada e eu

A mulher pegou três conduções e sumiu dos nossos olhos, antes que pudéssemos descobrir para onde ia ou de onde vinha. Chovia muito, e, como se já não adiantasse se proteger, entregou-se ao gozo da chuva que se lhe escorria com o rosto. Se houve lágrimas, ninguém viu.  E quando ela se lançou em disparada, sabe-se lá pra onde, também ninguém ousaria dizer se de loucura, pressa ou pavor!!! Quando os pacotes que levava foram ao chão, eu apostei no final apoteótico com trilha sonora de Yann Tiersen... A Fada Bêbada disse que era surto psicótico e que os pacotes caíram e a moça não viu.
Se ela voltou para casa, tomou um banho quente e xarope para não gripar, ou ficou girando na porta da entrada com a boca aberta, tentando agarrar gotinhas com a ponta da língua pra fora... não  se pode afirmar, afinal, a moça não é uma personagem icólume de histórias de bolso! Mas a Fada Bêbada fica com o xarope e o escalda pés. Eu fico com a crise de espirrinhos bonitinhos que a acometeram pela madrugada a dentro. Porque madrugadas gripadas são tão charmosas... Principalmente quando acompanhadas de doses  de whisky para aquecer os pés frios!
A noite está consideravelmente fria, meu nariz está muito entupido e a fada Bêbada está fumando cigarrilhas de canela. Eu acho que a moça continua rodopiando na frente de casa e a Fada Bêbada disse que não quer mais brincar... Então, que se dane a moça e volte para onde surgiu ou vá para onde voltava... Eu vou me recolher porque apesar de nunca querer dormir nem acordar, sempre o faço... e a Fada Bêbada que nunca quer nada, sempre faz tudo. Ela inventa as histórias, eu descubro e conto! A moça...dorme na paz dos anjos ( ou na fúria dos animais).
foto caçada na internet

sábado, 14 de maio de 2011

Para morrer de mentirinha

                                                                         
O coração pequenininho no peito que pia mudo... A cabeça maior que o corpo inteiro e um gosto de qualquer coisa amarga na boca... Agruras poéticas e não prosaicas... Prozac !
Eu fumo a guimba de um cigarro, bebo o vermelho-alaranjado da tarde na minha taça com uma cereja dentro...E minha trilha sonora alterna-se entre Miles Davis e Piaf, quando não paro tudo e toco  “Central do Brasil” para chorar mais que o pequeno menino que perde seu amor na estrada... Sim, porque todos os amores, um dia, perdem-se à margem de qualquer coisa. Até os não amores se perdem, os quase amores, os amores baratos e vagabundos... Ficam as histórias e um grito preso na garganta de quem não gritou.
Porque quem não morreu de amor, à margem de tudo,  nunca mais vai morrer de verdade. Vai morrer de gripe, de queda ou tédio.
  

domingo, 8 de maio de 2011

Feliz Dia das Mães, Luciana!

Porque não se nasce mulher (torna-se), nem todas nascemos com o gérmen da maternidade.  Avistei o meu, muito de longe, por volta dos vinte e quatro anos. Sempre achei os vinte e quatro uma idade genuinamente maternal, e a ciência endossa esse achismo (no meu caso achado). Mas eu queria ser minha própria mãe e minha própria filha. Havia um encontro comigo mesma ainda não resolvido a esta altura. Aos vinte e oito, adotei uma foto de indiozinho, tirada da revista National Geografic , que chamei de filho, nomeei e passei a carregar na carteira. Neste mesmo ano comecei a freqüentar a terapia.
Hoje tenho quatro gatos que não me desejaram Feliz Dia das Mães porque o fazem todos os dias com seu ronronar manhoso e seus olhos meninos. Caminho a passos largos rumo aos quarenta, quando, então, terei mais três cachorros, um periquito, dois papagaios e um macaco.
A Fada Bêbada diz que meu discurso piegas é tão previsivelmente barato no dia das mães, que ela se recusa a maiores comentários...

terça-feira, 26 de abril de 2011

De pés e pós

      Quando os passos de Betina cessaram, já era lua nova e a água parada moveu-se devagar para que despisse seu corpo de estrada e náusea.
      Assim, a poeira seca virou lama e o frio virou orvalho de noite desperta.
     Betina molhou-se em pés e pós. Subiu o adro da serra e deitou-se, a dormir, n’algum outro lugar.
      Quando acordou, Betina não era mais gente. Era seixo. E seixo não fala, rola. Então voltou Betina à estrada batida de sol. Voltou para casa.

                                                         " No último pau de Arara de Irará..."
                                      (Gil)

domingo, 24 de abril de 2011

Palavra (mal-bem)dita

"Na palavra, na linguagem, é que são primeiramente as coisas" 
                                                (M. Heidegger)

Então ela disse eu te amo e eu te amo era tão fátuo... Mas flamejava como bandeira ao vento e pelo vento ia-se e vinha e punha-se a voltar...
Ouvia-se como jingle repetitivo nos ouvidos incautos e até se fazia acreditar. Fê-la acreditar que amava
             ...
E assim amei por entre todos e todos os dias
Em que ouvia um silvo de silêncio
Amei  até as partidas e delas vesti todas as roupas...
           ...
E como ninguém mais acreditasse na palavra alçada ao tempo, ela insistiu em sua crença solitária e morreu de amores – só para contrariar os avessos, só pela rebeldia  e para  continuar escrava das palavras!

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Como espantar Fadinhas e /ou Mariposas

Fadas Bêbadas em finais de semana estão para mariposas na luz...Rodopiam, penduram balangadans no pescoço e fitas nos cabelos, cantam desritimadamente, quando não desafinadamente, que quem assim as vê jura serem eternas! Que sempre estiveram ali e não vieram nem irão a lugar nenhum.
Mas, como as mariposas, ou bichinhos da luz, basta que se apaguem as luzes ou deixem que elas mesmas se enfastiem e torrem-se-lhe os miolos, os badulaques e os últimos tostões.
Apaguem a luz e mandem que elas se vão, que , como por magia, elas jamais terão estado ali.

sábado, 26 de março de 2011

Nova candidata ao BBB12

A Fada Bêbada anda tão estratosférica ultimamente... Disse que está pensando em ir para a TV contar seus experimentos sexuais. Deve estar achando que, porque meia dúzia de poetas agora a conhecem, ela passou a ser objeto de interesse da grande massa! Logo ela... tão liberta de interesses “líquidos”, tão pretensa e erroneamente anárquica... Agora querendo postar-se sob os holofotes... tsc tsc... Como todo mundo tem seu ponto fraco...
Tenho observado que não vem se recolhendo solitária em sua banheira de motel, vem estando mais sóbria, menos ácida...
Meu receio é que, num sábado desses, de outono escaldante, ela encontre platéia para suas histórias de amores tórridos... Porque ela é uma psicótica que precisa aumentar o lastro de suas conquistas como se isso fosse torná-la mais mulher ou menos coisificável... Se ela inventar loucuras, ignorem. Ou ignorem quando ela me chamar de recalcada pelas críticas que lhe faço. Nunca pretendi que fosse uma fada rosa de sapatinhos de cristal, mas coçar o saco e cuspir no chão é demais para quem refuta tão ferozmente os paradigmas culturais de gênero!!!
Enquanto isso ela me ignora totalmente e liga para a produtora que estaria interessada em televisioná-la... Ela ficaria mesmo muito bem de BBB : Bela, Braba e Besta!!!

segunda-feira, 14 de março de 2011

"For no one"

Hoje nem vodka, nem rum. Só a cerveja quente esmigalhando o fígado. Palmas para a mulher solitária da madrugada! Palmas para ela que enche o peito de fumaça barata e os olhos de lágrimas para chorar por ninguém, apesar da companhia  insistente de um nome de homem que, mais uma vez, ela não vai pronunciar.Porque jamais chorou por João, José, Noel, Bené... Chora por ninguém. E ouve a incansável trilha dos Beatles na versão de Caetano, só pra abrasileirar. Já é a nona vez. Ainda toca mais dez até que ela adormeça, porque o pranto acalma. O dia virá acordá-la.

sábado, 5 de março de 2011

Chatices de Carnaval

Ela nem gostava de pegação de Carnaval. Era gente muito suada, gargarejando cerveja para tirar mau hálito,  em níveis estratosféricos de embriagues, que ela preferia ser apenas a testemunha ocular de Momo. Sempre presente, mas numa distância efetivamente regulamentar.
E embora toda essa chatice que lhe era inerente, adorava Carnaval! Esperava o ano todo para sentir a euforia dos primeiros dias e ia ficando triste tão mais perto se aproximasse a quarta feira.
Estava encastelada no oitavo andar do prédio da Central do Brasil, num plantão interminável da Secretaria de Segurança Pública, que, quando o relógio marcou as seis da tarde, ela já estava seguindo o primeiro bloquinho chinfrim que passou à sua frente. E fantasiada, coisa que ela poucas vezes experimentava! Estava de presidiária, com uma plaquinha de 171 na camisa e algemas sugestivamente penduradas no braço.
Então seria muita afronta às regras momescas se ela hesitasse ao moreno de aproximadamente 1,85m de altura que lhe dera voz de prisão, dentro de uma fantasia de policial e munido de um enorme cassetete.
Nem havia segundas intenções naquela pegação, afinal, não existe intenção de coisa alguma nessa época. Ninguém quer ir, nem ficar, nem sair. Só o instante presente existe. Porque todo o resto do tempo se esquece numa amnésia alcoólica ou num sonho ressacado do dia seguinte. E como não seria diferente, lá pelas duas da manhã,quando já não tinha mais sandália nem documento e já havia trocado o policial bonitão por dois bêbados mais bêbados que ela, apoiou-se no poste, tentou arrumar os cabelos irremediavelmente desgrenhados e tascou um beijo rasgado no gringo que a comia com os olhos. Àquela altura já estava quase curando o porre, mas felizmente a chatice ela só resgataria depois de quarta-feira. Sentou no meio-fio, deu uma enorme golada na cerveja quente que trazia e não conseguiu deixar de gargarejar porque continuava não tolerando mal hálito alheio!

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Pra além do arco-íres

Todos os dias, só acordava ao tocar os dedos no chienelo ao pé da cama. Então fazia nascer o dia e ela se editava em mais um capítulo. Era a novela que nunca acabava porque só tinha começo. Ou seria cinema? Adorava fins de ano, porque haveria o primeiro dia ... Fim de década... E já havia passado por duas. Presenciou o fim do milênio e devia se achar uma privilegiada por isso. Fazia todos os planos e começava a executá-los. Mas depois do início vinha o meio e, como ela só queria o novo, voltava ao zero e vivia assim fantasiada de fênix, escondendo as rugas que também insistiam em começar.
Ela adorava promessas – as próprias e as alheias. Assim, tudo era novidade e ela garantia que não se jogaria do terraço!
O tédio era uma pedra que ela jogava na vidraça do vizinho da frente.
Certo dia minha vidraça não se estraçalhou e tudo que soube foi que a inquilina do apartamento de frente ao meu havia se mudado. Certamente fez as malas e atravessou o arco-íres!

domingo, 2 de janeiro de 2011

Para você, minha Bitta

Silêncio é só o que consigo ser hoje. O vazio que o tempo planta entre presença e ausência. Horas se tornarão anos e te levarão para longe de mim. Porque ainda agora você estava aqui nos meus braços tão pequena e indefesa. Seus olhinhos... Cadê você, Bittinha? Bibi? Bibibi? Bibi!!! Ah, meu amor, você está aqui... só não a vejo, mas sinto. Cuidando de seu filhinho Nino adotado, deitando sobre as roupas deixadas na cama, soltando pelos pela casa inteira. Eu te amo, minha Bitta.
O amor teima em não se resignar em amar sem você, mas ele agora tem de ser ainda mais sublime porque vai amá-la por toda parte, por toda a eternidade, mesmo sem vê-la em seu aspecto físico. E toda vez que eu pegar meu violão estarei tocando para você também, estarei a embalando nas notas que você sempre me ajudou a tocar.
E até que eu me acostume (?) em não lhe ver, estarei oca, apesar do amor enorme que me alenta. Um amor que flutua sem gravidade e não tem mais forma definida. É esférico e eterno em busca de seus olhinhos, de seu pelo tigrado dormindo ao meu lado e me aquecendo no frio.
A morte não existe, Bitta. É uma invenção do tempo, um furto abrupto da existência. Mas é só um duto do amor para a eternidade.