quarta-feira, 29 de setembro de 2010

O belisco

Vejam vocês como esta vida é toda torta... Cá eu fico escrevendo poemas, "causos"... Todos de alguma forma referentes à situação feminina, à ótica feminina... E eis que uma minha poesia acaba de ser selecionada para publicação pelo Sindicato dos Bancários da Bahia no Prêmio de Poesia Elisa Lucinda... Até aí tudo certo. O curioso é que a poesia selecionada fala justamente sobre pinto, pênis, bilau, cacete (e paramos por aí porque vocês já entenderam sem que eu precisasse continuar a descer o nível... ou a subir  -  a depender do ponto de vista...).
E alguém, muito maliciosamente, sugeriu que estaria faltando "culhão" no que escrevo... Vai ver que é por aí...
Então, a pedidos, e pra não dizer que não falei de flores... Falo, pois! Eis que FALO e pronto! Com vocês "Obelisco":




Digam aos homens que estou nas esquinas
às mulheres, que espero
aos meninos, que durmo.
E se não disserem nada, então estarei sentada
no canto da sala vazia
no meio da rua deserta
Estarei deserta
E serei tão crua como toda carne
Tão boca como um sorriso doído e preso.
Se não disserem,
Falo
Às mães sem filhos
Aos homens dos meninos
Aos que queriam não querê-lo ter.
Calo.
Pisado e batido
E calo pela boca cheia.

P.S -  Achei mais recomendável não postar foto hoje!!

domingo, 26 de setembro de 2010

Com doçura e com dendê

Receita de Caruru:

100 quiabos
1 xícara de castanha de caju
100 g de amendoim torrado e moído sem casca
2 xícaras de camarões defumados, descascados e moídos
2 cebolas grandes
2 xícaras de azeite de dendê
3 limões
2 colheres de sopa de sal
4 xícaras de água quente
pimenta
gengibre
alho

      O modus operandi da iguaria ainda não desenvolvi. Sei que hoje é dia de caruru na minha velha Bahia e eu estaria picando quiabos, se lá estivesse, para que uma boa baiana fizesse o enorme panelão e chamasse, depois, sete meninos que se lambuzariam na panela de barro! Mas apesar de autêntica, minha baianidade se limita ao estado de apreciadora inveterada da culinária do dendê, afinal, nem todo cão que não ladra morde, nem todo bigode é de gato e nem toda baiana é tão boa quanto sugere sua africanidade! Então, resta-me, ao menos,distribuir doçura... Que venham, pois, os meninos se empanturrar de bombom...Mas erê que não se comportar não ganha doce!!!  E depois eu me acerto com Cosminho e Daminhão...

TECLA SAP para os não baianos: Dia 27/09 é dia de São Cosme e Daminhão, que no sincretismo, representam os erês, ou seja,  as crianças no Panteão afriano.
A oferenda para os erês é, pois, muito doce e faz-se o tradicional “caruru de Cosminho” porque na Bahia, quem nasce em setembro não faz aniversário, faz caruru!!!

sábado, 25 de setembro de 2010

Mãe Véa

Minha Bahia
É uma mãe preta velha
Cheia de uns filhos idos e vindos
Que nunca vão.

Uma preta com seus muitos guizos
E risos largos.

Mãe véa mandigueira
Que se me amarra ao destino dos santos
Num doce e mole quebranto
No banzo dos orixás

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Ares Primaveris

      Segundo dia da primavera... Estação bonita, boa pra se nascer – os outros signos que me perdoem! Os nativos de libra costumam ser propensos a querer fazer justiça a todo custo (o que, a princípio, os torna idealistas e eternos adolescentes), são aspirantes das artes e costumam viver mais nos ares que em terra firme! Mas são gente boa – como costuma ser a galera do resto do zodíaco! E, astrologias à parte, outro dia eu conversava com a Fada Bêbada, que me confessou certo cansaço. Cansada de fazer caras e bocas, de estar sempre bonita – ou tentar! Cansada de se apaixonar perdidamente, mas controlar-se para não assustar o (in?)felizardo de seus desejos, porque, segundo ela, os rapazes andam muito temerosos ultimamente. Temem o compromisso, mas também mulheres muito decididas que os chamam na chincha e os fazem brochar – quase sempre... Cansada de escova progressiva, de votar no PT, sem o velho entusiasmo... Então, no meio de um gole e outro de gim – neste dia ela estava completamente out, decidiu que, apesar de ser canceriana e pouco afeita a rompantes, incorporaria os ares librianos e votaria em Marina, apesar do PV (Partido Vendido – palavras dela), deixaria o sovaco cabeludo, tiraria quinze dias de férias em Itacaré ou Boipeba e processaria a operadora de seu cartão de crédito pela cobrança de juros abusivos. Se tudo isso a fará sentir-se melhor... ela não soube responder ainda, mas,  muito categórica, afirmou que, apesar de nem estar aniversariando, nem tampouco carpindo uma TPM desmedida, queria poder enfeitar de flores sua casa inteira e aspirar os ares primaveris desta estação piegas que por hora floresce entre amores-perfeitos, gérberas e lírios brancos... E que, se nada der certo, ela compra um vaso de comigo ninguém pode e leva com duas garrafas de cana pra´quele velho conhecido motel, enche a banheira e termina a noite ouvindo Vicente Celestino no seu mp3 -  que iPhone ela deixa para os virginianos ou escorpinianos arrojados!

terça-feira, 21 de setembro de 2010

"Força Estranha"

     Pois se a força de Sanção padeceu à malícia de Dalila, no milenar Livro Bíblico, ontem a moça entrou no salão e fez a felicidade da cabeleireira, que, sem pena, pelou-lhe as madeixas e expôs-lhe a nuca.
     A moça ordenava, incisiva, que a outra não deixasse rastros da antiga cabeleira. “Cabelos são o atavismo espúrio dos vícios de nossa feminilidade”.... Nesse instante a cabeleireira parou, franziu a testa... E como não atingisse a mensagem posta, continuou a tilintar-lhe a tesoura afiada e precisa.
     Findo o processo, a moça olhou-se de frente, dos lados, de costas e, muito satisfeita, lançou num suspiro: "Só para garantir que não vou cair na tentação de deixar o tal fulano me puxar pelos cabelos!"
E saiu, cheia de uma força certamente maior que seu orgulho inegavelmente ferido.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

O nome de Alice

Queria ser menina, no auge dos seus oito anos, e passar a tarde inteira no quarto brincando de mulher. Queria estar só. Rafaela tinha todas as idades em suas breves caminhadas.


Era uma quinta–feira quando encontrou uma senhora caminhando por volta das seis da manhã, com longos cabelos brancos que lhe chegavam abaixo dos ombros. Ela queria ser aquela mulher esguia, percorrendo o calçadão e ter o olhar de ferro como tinha aquela jovem senhora.

Queria chamar-se Alice, é tão mais sutil, mais feminino... Alice lembra uma menininha loira, que cai num buraco, que descobre sonhos engarrafados. Ela queria ser Alice ou Berenice que é um nome nobre, mas Rafaela era muito pouco para quem queria pouco mais que dias inteiros, perdida numa mata virgem.

E sonhava ter um namorado que dançasse com uma flor vermelha entre os lábios para entregar-lhe ofegante. Dançariam a noite inteira e não diriam uma palavra. Rafaela não queria palavras, queria olhos profundos e soslaios sutis, tudo que se pudesse fazer na ponta do lápis ou dos pés, como o desenho de uma bailarina que amarra as sapatilhas.

Imaginava nunca deixar o seio materno ou, ao menos, saber o que seria isso. Como se pode esquecer algo que dizem tão fundamental? Como não lembrar do seio farto de Da. Matilde? Por que ninguém lembrava do colo da mãe? Então ela queria uma filha e ser sua própria filha...pular dos dois ao dez anos, amar cada aniversário, queria ser um sonho de Alice e ouvir dizerem-na “Amo você , Alice”, queria sentir-se grande e gorda no peso de Berenice. Achava que mulheres grandes e gordas eram atraentes, tanto quanto as magras, ossudas, às vezes sem graça.

Mas o espelho se lhe mostrava tão pequena e frágil. Bracinhos curtos que mal abraçariam um homem largo ou uma mãe carnuda. Não tinha espelhos em casa.

Gostava de um perfume que sua vizinha usava e não sabia o nome, também nunca perguntaria. Todo perfume que começava a usar enjoava e jamais conseguia usar o frasco inteiro. Enjoava. E era bem isso...Rafaela era um nome enjoado.

Descobriu que podia trocar de nome, alguém falara uma vez e ela gostou tanto da idéia que só não buscou de pronto um cartório porque a dúvida não se dirimia...Alice, Berenice...mas Isaura era um nome bonito e Firmina era o nome de sua avó. Era bonito ter nome de avó, então poderia ser Alice Firmina ou só Alice. Nem percebeu que o tempo passava e quando voltou ao mundo dos papéis já havia passado tempo demais e agora seria Rafaela para sempre.

Foi aí que perguntou se seria mesmo Rafaela. Havia de ter um nome místico, um nome espiritual... As cartas, ou as runas deviam poder renomeá-la...certamente que podiam! Sua filha chamar-se-ia Carmem, como a da ópera e teria cabelos longos como ela não tinha.

Temeu não suportar o incômodo do seu corpo velho demais e jovem, eternamente jovem. Ela queria ser uma mulher. Ela queria amar um homem que a amasse ou mesmo um príncipe que se transformasse em sapo.

Então um psicanalista, que ela jamais cogitou procurar, revelou-lhe que seu prazer estava em vitimizar-se, contaminar-se com seus agouros. Assim Rafaela encontrou o caminho dos céus e gozou, gozou e gozou até cair fatigada, sem mais nome ou sobrenome.



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sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Um poeminha fêmea

Ahahahaha! Hoje não tem jeito: vou postar uma poesia sim. Mas não fechem o blog ainda. É pequena, rápida e tem até um certo embalo... Juro, não dói. Ou, de repente dói porque a poesia é fêmea, como a dor e a beleza do parto (dizem) ou da primeira vez (Otto anda cantando por aí que "da primeira vez dói...". Dói?

Leão no cio
Da leoa
Filho no colo
Da mãe
Homem no centro
Da Terra
Tudo no meio
Das Coisas
Bico na boca
Do peito dela
Vela, revela do bicho
A fera
Fere, lateja e corteja
A bela