quarta-feira, 14 de março de 2012

Diário do Fim do Mundo – Parte II




Não sabia o que viria depois de tudo. E uma parte sua, não derrotada, ainda queria tomar os remos de Caronte e singrar, com medo sim, mas com norte ao outro lado do Aqueronte. Queria latir mais alto que as três cabeças de Cérbero, porque é certo que ela correria para onde quer que houvesse chão.
Se alguma razão pudesse confortá-la, era a de que, depois da tempestade, se não viesse a bonança, ao menos um solzinho tímido havia de surgir. Depois de todo apogeu, a queda ; depois de todo paroxismo, a saúde... ou a morte. Então que viessem as Fúrias, os monstros marinhos, os Titãs... Ela já os esperava a todos em sua sala de estar e talvez os convidasse a uma cigarrilha de canela, ou a um cigarro de palha!
Abriu mais uma vez seu Diário de Fim do Mundo e desta vez não escreveu palavra. Rasgou a pagina e a roupa. Deixou-se cair rota no abrigo do próprio grito.
E antes que alguém pudesse dar conta de onde vinha o estertor, levantou-se, sacudiu o pó do corpo e inflou o peito de um ar ainda pesado. Vestiu uma calça que jazia na bagunça quase infinita da cama e, já de pé, defronte ao espelho, afastou os longos cabelos do seio doente. Contemplou o colo nu, num momento suspenso entre a vida e o porvir. Acariciou os dois, sem distinção. Afinal, “nunca as mulheres são tão fortes do que quando se armam de suas fraquezas”.
Vestiu uma blusa e bateu a porta de casa atrás de si, sem munir-se do óbulo sob a língua. Sabia que não teria condutor ao seu Hades, mas nem por isso abandonar-se-ia à eterna pasmaceira da margem de cá

Nenhum comentário:

Postar um comentário