domingo, 30 de setembro de 2012

Quando vi os olhos embaçados da moça e perguntei o que tinha, respondeu:

- tenho um gato, um pé de coentro alguma paciência

E por que a tristeza?

 - Preciso de mais!!!  -  e saiu antes de especificar se eram mais gatos ou coentro que lhe faltavam!

sábado, 22 de setembro de 2012

A fada do feijão


Fadas são como pirimlampos... aparecem e desaparecem ao seu bel prazer. Assim também os duendes ou o famigerado Mestre dos Magos lembram-se dele? Famigerado sim, porque segundo consta, no fim das contas ele atrapalhava mais que ajudava com seus enigmas indecifráveis... Mas, voltando às fadas, gente, convenhamos, não dá pra ficar vendo fada o tempo todo, a não ser quando se toma um ácido, ou quando se está apaixonado ou apaixonada por uma delas. Fadas são exuberantes demais, afoitinhas demais, fazem muito barulho ou muito silêncio... têm mais é que ser intermitentes mesmo! Doce demais enjoa, salgado demais dá sede, muita fritura dá azia! Então não me venham falar de relacionamentos fofos, incapazes de conviver com as ausências. Não me venham falar desta colaboração geminada, moto-contínua, que não olha para os lados, que não sente outros sabores... Alguém pode precisar quantos tipos de feijão existem? Sim, feijão é uma semente leguminosa adorável e os apreciadores desta iguaria, sem dúvida, pretendem continuar degustando os novos tipos geneticamente modificáveis, e, claro, voltar sempre e fielmente à boa e velha feijoada... e ao feijão fradinho, feijão verde, carioquinha... Feijão, lembrem-se, é ítem básico na cesta básica da família brasileira.

Fadas gostam de feijão, é isso!  Aparecem famintas e desaparecem com a inevitável indigestão de seus apetites glutões! Então, não maldigam as fadas. Não é falta de amor, atenção, bem querer. É excesso de andanças, ou voanças... Elas somem, mas aparecem... somem... aparecem de novo... e somem...aparecem...

 

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Prova sem crime

No Direito Penal, ciência chata e inútil, o crime putativo se dá quando determinado agente desempenha dada conduta, imaginando tratar-se de tipo penal, traduzindo: a criatura comete certo ato imaginando que é crime. Logo, se a criatura realiza o tal ato, a priori haverá provas: provas de um não crime!
Foi quase assim com Albertina. Namorava um rapaz há mais de três anos e, há pouco mais de um mês estavam noivos, com data marcada do casório e tudo! Entretanto, por mais que andasse na linha, ele carregava uma pulga enorme atrás da orelha. E era uma pulga gigante, bem nutrida, que dia após dia engordava mais... Havia dias em que a pulga aparecia mais que a cara sisuda e séria do noivo ressabiado...
Então, Albertina já incomodada com a presença insistente da dita pulga, resolveu que daria fim àquela situação, de uma forma ou de outra. Tratou de espalhar por ai que andava de chamego com o filho da vizinha, com o amigo do irmão, que trocava bilhetinhos com o rapaz da seguradora e que ficava até altas horas ao telefone com o professor de violão. Não deu outra: assim que o burburinho chegou ao pé do ouvido do noivo, ele rasgou todas as cartas de amor que ela o havia mandado, devolveu-lhe todos os presentes, desmarcou a data do casório e tirou a pulga da orelha, passando a desfilar com ela de braços dados pra cima e pra baixo na maior intimidade.
Albertina? Não foi, portanto, um caso de crime putativo, nem de final feliz, nem o escambau. Se o Direito fosse uma ciência certeira e profícua talvez servisse pra disciplinar e conduzir sentimentos, mas qual o que?
 Ela disse que estava em paz, que deu comida a quem tinha fome, que alimentou o mostro alheio faminto e que  pra esta lei não há código, nem juiz,  nem tribuna. Apenas infratores... ou benfeitores!

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Atavismos pós modernos


Cinco quilos e meio mais gorda e depois de tentar uns seis regimes descompromissada ou descaradamente mesmo, resolveu, meio como que sem querer, adaptar-se à nova figura mais rechonchuda. Os anéis do dedo anelar agora só cabiam no mindinho, o que tornava inúteis as antigas alianças de compromisso. E que mal havia afinal, se eram velhas alianças de ex-compromissos? Melhor que não coubessem mais em dedo nenhum mesmo!

Agora era esquecer as roupas apertadas e desfilar o novo look sem restrições... uma espécie de abuse-se sem moderações. A ordem do dia era ser gordinha e feliz! Embora decerto esta felicidade estivesse sufocada entre a muita malha do camisão XG que lhe fazia as vezes de mortalha sepulcral. Depois de ouvir um desavergonhado “ô lá em casa!!!”, tinha de admitir ter ficado mais à vontade no corpanzil avantajado... Muito embora tivesse a consciência de ser  uma moça alta, de traços harmoniosos que conversavam com a tonalidade da sua pele e a expressividade dos seus olhos, segundo palavras do personal stylist que, mediante o módico custo de seus honorários, fê-la ressignificar sua relação coma balança !

E tava tudo quase certo. Mais umas cinco sessões de terapia e saberia como dialogar com a enorme e irrefutávelvel  saudade da época em que esperneava e retrucava as cantadas baratas dos machos alfa que tentavam reduzi-la à condição ínfima de objeto sexual.

Mas enquanto não atingia esta elevação espiritual, que a deixaria a um passo da felicidade, abria a geladeira pra pensar. Sim, porque longe de ser um hábito de gordo, abrir a geladeira para caçar coisinhas geladas é, praticamente um atavismo existencial da pós-modernidade!